1/03/2007

TEXTO DE CONCLUSÕES enviado para o Conselho Nacional de Educação

Visões de Futuro para Aveiro
Desafios locais de educação


(Encontro integrado no Debate Nacional de Educação)



Gabinete de Estudos/PS-Aveiro



Oradores:

Prof. Doutora Teresa Vasconcelos, “Desafios da Educação e Desenvolvimento na Infância e no Ensino Básico”

Prof. Doutor Joaquim Azevedo, “Contexto Social Local: Participação das Redes Sociais e das Famílias”


Moderadora:

Prof. Doutora Isabel Alarcão


Desenvolvimento

Este primeiro encontro, realizado no âmbito do Ciclo de Debate “Visões de Futuro para Aveiro”, foi aberto pelos seus coordenadores Professora Doutora Teresa Fidélis e Dr.Ângelo Ferreira, que enunciaram os seus objectivos mais gerais como a procura de um entendimento mais profundo das dinâmicas de desenvolvimento local da região de Aveiro, em múltiplas áreas de intervenção, tendo por referência os novos desafios que globalmente se colocam às sociedades actuais. Os oradores salientaram a importância da Educação neste propósito de mudança, razão pela qual o referido ciclo se inicia com um debate nesta mesma área.

De seguida a Professora Doutora Isabel Alarcão situou este encontro no âmbito do Debate Nacional de Educação, apresentou os palestrantes convidados e referiu o interesse das temáticas agendadas, bem como a importância da participação dos cidadãos neste tipo de iniciativa.

Seguiram-se as intervenções dos Professores Doutora Teresa Vasconcelos e Doutor Joaquim de Azevedo, tendo de imediato sido aberto o debate ao público presente.

No final o encontro foi encerrado pelo Ex.mo Senhor Presidente do Conselho Nacional de Educação, Professor Doutor Júlio Pedrosa, que contextualizou as questões emergentes neste encontro no quadro mais amplo do debate nacional, tendo deixado alguns desafios de futuro que pedem a participação de cada pessoa em particular nos processos de mudança e de desenvolvimento pessoal e social.



Ideias emergentes no Encontro

De todos os contributos emergentes, quer a partir de argumentos que validam teoricamente a importância da formação nos processos de desenvolvimento, quer a partir das boas práticas, referenciados pelos palestrantes e percebidos na sua relação com os problemas que se identificam, local e universalmente, foi possível elicitar um conjunto de ideias de entre as quais se destacam as seguintes.


Desenvolvimento local/global: a Educação como prioridade inalienável

Foi repetidamente referida a importância decisiva da Educação na transformação das perspectivas pessoais e colectivas e na abertura de novas possibilidades de intervenção cívica dos cidadãos como produtores de mudanças ajustadas e pertinentes às suas próprias realidades, desde que informadas por uma visão mais abrangente, eticamente sustentada e consequente dos problemas percebidos localmente. Desse ponto de vista, foi referido, como questão de princípio, que a Educação, enquanto desenvolvimento do potencial humano, é elemento crucial do desenvolvimento de um país, pelo que colocar a Educação no centro das nossas atenções e esforços de desenvolvimento humano é determinante no mundo globalizado e competitivo que vivemos.


Desenvolvimento humano: a Infância como período fundador

Reafirmando a importância decisiva dos processos educacionais, foi tornado evidente o carácter crucial da preparação precoce das novas gerações, garantindo-lhes, pela qualidade da sua educação, o desenvolvimento de novos saberes básicos, percebidos como competências estruturantes e fundamentais para a realização pessoal e para a vivência pacífica e solidária nas sociedades multiculturais, que a actual facilidade e mobilidade das ideias e dos cidadãos tão intensamente estimulam e concretizam. Neste âmbito, foram destacadas as competências aprender a aprender como condição indispensável ao desenvolvimento continuado ao longo da vida, o desenvolvimento da resiliência como capacidade para lidar e gerir com sucesso situações de dificuldade e o saber fazer face às transições de forma dinâmica, minimizando atitudes de passividade e dependência e estimulando em simultâneo a iniciativa e a autonomia.

Foram referidos como objectivos fundamentais, nesta fase, o desenvolvimento de competências sociais de cooperação, a estimulação da iniciativa nas interacções, o saber fazer amigos e o desesenvolvimento da auto-confiança, da auto-estima e do auto-controle como condições de promoção do sucesso dos Alunos. Nesse sentido, foi salientada a necessidade de:

a) Considerar o desenvolvimento da Infãncia como um processo alargado, progressivo e contínuo num período que vai dos zero aos doze anos, o que pressupõe um novo entendimento da organização curricular, no sentido de uma maior transversalidade, que passa pela articulação dos ciclos de escolaridade e por um esforço de compreensão integrada dos saberes curriculares.

b) Facilitar os processos de desenvolvimento, garantindo a qualidade dos múltiplos factores que nele interferem durante o período pré e péri-natal de cada criança, tornando-se particularmente relevante uma cuidada atenção às condições de vida e de apoio social às famílias, nomeadamente às mães. Conforme Daniel Sampaio, invocado a este propósito no debate, “é uma necessidade irredutível da família ser ajudada no seu processo de crescimento, através do fornecimento de serviços que possibilitem a co-construção de uma realidade familiar diferente. A sua não - organização em Portugal é uma forma de exclusão social”.

c) Ter em conta as lógicas integradoras que informam os documentos oficiais e a legislação reguladora da organização e gestão curriculares, nomeadamente quanto aos princípios subjacentes às Orientações Curriculares e à Lei de Bases do Sistema Educativo/86, quando nela se refere que “a articulação entre ciclos obedece a uma sequencialidade progressiva, conferindo a cada ciclo a função de completar, aprofundar e alargar o ciclo anterior, numa perspectiva de unidade global do ensino básico”(Artigo 8º, ponto 2).

d) Apostar e garantir a qualidade da formação de Professores/Educadores como profissão ao serviço do desenvolvimento integral, aprendizagem e bem-estar dos Alunos o que pressupõe uma formação articulada com unidades curriculares comuns e a adopção de novas metodologias de trabalho.

e) Promover uma cultura de formação que favoreça a articulação entre docentes dos diferentes níveis de escolaridade, o mútuo reconhecimento, o envolvimento das famílias e o desenvolvimento de parcerias no interior das comunidades.


Relação Escola-Sociedade:expectativas, resultados e desafios

Tendo em conta a já referida importância da Educação nos processos de desenvolvimento pessoal e social, a elevada taxa de abandono em Portugal foi referida como preocupante e inadmissível para um país que se quer moderno e desenvolvido. Por um vasto conjunto de razões, as escolas nem sempre conseguem corresponder ao desafio que lhes é exigido pelas sociedades contemporâneas, sobretudo porque tudo lhes é pedido como se estas fossem as responsáveis únicas pela missão de Educar/Formar. Hoje em dia, todas as responsabilidades nesta matéria são acometidas à Escola, sem se perceber que essa nobre e importante tarefa social não pode ser assumida por ela de forma solitária. Ficou muito clara a ideia de que a “rede escolar” formal tem malhas muito largas, que deixam escapar grande parte dos cidadãos, sobretudo aqueles que se encontram em idade escolar, frustrando expectativas e gerando desalento. Desse modo, “ganha relevância a necessidade de se passar a ver a Educação como tarefa de todos, da comunidade, pelo que se carece de uma nova e activa abordagem, onde assume especial importância a organização de redes sociais nas quais as comunidades através dos seus cidadãos, das suas associações, das escolas e das famílias concertem as suas prioridades e se comprometam na transformação das suas próprias condições de vida”.

Esta cisão na perspectiva educacional, com todas as suas nefastas consequências, constitui um dos factores fulcrais na cadeia de insucessos que, conjuntamente, a educação formal (escolarizada) e a educação informal (simultaneamente) geram e lamentam, criando climas de generalizada insatisfação, pessimismo e mútua recriminação. A capacidade de diálogo permanente, considerando-se a escola parte constitutiva da comunidade, é um instrumento de inclusão, quer cultural, quer funcional, quer económico.

Assim sendo, a Escola deverá ser vista como uma rede de oportunidades, de malha estreita, ancorada nos múltiplos recursos educativos, que nesta perspectiva ultrapassam a concepção tradicional de recursos físicos/instalações. Os factores de humanização das relações, definição clara de prioridades locais, regulação desburocratizada e implicação dos cidadãos nos processos de decisão e de resolução dos problemas foram sugeridos como chave para a indiferença e apatia que testemunham o desalento e a perplexidade. Salientando a importância deste novo tipo de abordagem, foi particularmente veemente e desafiadora a afirmação de que “a escola se deve responsabilizar e ir buscar, um a um, todos os alunos que, pelas mais variadas razões, escapam pela rede, perdendo a oportunidade mais decisiva das suas vidas como possibilidade de desenvolvimento”.


Poder local: gestão, liderança e desafios

Foi considerado decisivo na promoção de uma nova visão dos mecanismos, dinâmicas e estratégias de desenvolvimento local/global o papel das Autarquias na assunção da liderança e na definição de prioridades da sua intervenção. Salientou-se que as autarquias não apostam na Educação, mesmo quando os discursos pareçam dizer o contrário. O próprio investimento em infra-estruturas deve ser questionado, pois muitas vezes elas são inadequadas às necessidades educativas e à criação de uma verdadeira comunidade educativa.


O grande desafio está na capacidade de mobilização, procurando um outro sentido, efectivo, para a autonomia quer das autarquias, quer das escolas e um outro sentido, também, para as práticas de cidadania de cada cidadão em particular. Conforme foi referido, Portugal, no seu esforço de desenvolvimento, procurando corresponder aos desafios assumidos com a Declaração de Lisboa, não pode prescindir de nenhum dos seus cidadãos nesta caminhada exigente e difícil. Na sua maioria, as escolas falham na sua missão, por estarem distantes da realidade social, pelo que há um enorme trabalho a desenvolver na aproximação das pessoas entre si e destas com os contextos de vida.

Neste modelo de desenvolvimento integrado e partilhado assumem-se como conceitos-chave, as ideias de compromisso, proximidade e reconhecimento de todos os cidadãos numa perspectiva de exercício democrático que gera, nesse gesto de reconhecer, uma outra cultura de inclusão e de fraternidade.


Formação e Desenvolvimento: questões em aberto


· Tendo em conta os pressupostos avançados no debate, tornou-se óbvia a necessidade e urgência de uma aposta na formação:

a) Dos professores (inicial e continuada), reconceptualizando perspectivas, objectivos, práticas, relacionamentos e dinâmicas identitárias.
b) Dos Pais/Famílias, reequacionando papéis e responsabilidades.
c) Dos agentes políticos em geral, mas de um modo particular dos responsáveis mais directos nas autarquias pela definição de prioridades e pela sua gestão, concretização e avaliação continuada.

· Ainda numa lógica de articulação, presente ao longo de todo o debate, foi assinalada a vantagem das parcerias entre as autarquias e as instituições de formação com destaque para as universidades e outros centros/instituções de formação, acentuando a mais-valia de cada contributo na definição mais clara, precisa e sustentada de soluções inovadoras e colegiadas para os problemas emergentes.

Configurado nas suas linhas mais genéricas e princípios reguladores um outro modelo configurador das práticas educacionais na sua relação com as dinâmicas de desenvolvimento ficou, ainda, em aberto a questão educacional de como mobilizar os cidadãos para este envolvimento responsável e directo, num clima de grande indiferença e desencanto face às práticas de cidadania, descurados e difíceis que estão, e se tornam, os processos de desenvolvimento ético como génese de uma cultura solidária, justa e generosa.


Conforme se referiu anteriormente, o encontro foi encerrado pelo Senhor Presidente do Conselho Nacional de Educação, que enquadrou as questões emergentes no quadro do Debate Nacional, salientando os pontos convergentes e dando particular relevo e importância à participação de cada cidadão na procura de respostas possíveis para os desafios que, a todos, se colocam.

Em jeito de síntese e procurando estabelecer algumas conexões entre os níveis de debate (local e nacional), parece ser possível afirmar que as temáticas acima referidas se enquadram e podem contribuir de um modo mais explícito e ainda que modestamente, para ensaiar algumas respostas às seguintes questões:

  • Que competências de cidadania devem ser adquiridas por todos os alunos na escolaridade básica universal?
  • Como promover uma melhor articulação entre a educação escolar e outras formas de aprendizagem ao longo da vida para que todos exerçam uma cidadania activa e responsável?
  • Como fomentar uma melhor articulação entre os professores e os pais/encarregados de educação tendo em vista melhorar o sucesso escolar dos alunos?
  • De que formação inicial e contínua precisam os professores nos próximos anos?
  • Que organização escolar poderá melhorar o processo educativo?
  • Que tipo de autonomia e que mecanismos de responsabilização devem ser postos em prática nas escolas?
  • Que podem as comunidades locais fazer mais pelas suas escolas?

Aveiro, 13 de Dezembro de 2006

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